Tânia

Tânia de pele morena, negra como a luz da noite. Passeia pela cidade observando os carros, os prédios, as casas e os endereços. Um mundo estranho, sem terra, sem barro, sem verde.

A coisa mais parecida com árvore é um poste, suas folhas são as fiações, a perigosa fiação.

Ela quer chegar ao topo, acha que lá pode desfrutar do sabor de uma manga ou então de uma maçã. Mas um senhor de terno logo lhe puxa a barra do vestido dizendo que meninas não sobem em postes. Então ela desce desapontada, porque de onde ela veio as crianças sobem onde querem, não importa se é menino ou menina.

Mas ela continua a andar na cidade, passando por carros e pontes. Descalça, parece voar pelo céu, tocar o topo dos prédios, voar com as pombas. Mas ela sente a fumaça dos ônibus e dos cigarros, e isso a sufoca. Então ela abre os olhos e percebe que não voa, apenas anda, descalça. E toda aquela caminhada sobre as calçadas de concreto da cidade machucam seus pés .

A noite vem lenta e Tânia espera paciente pelas estrelas que não aparecem. Ela olha o céu, procura um brilho, qualquer ponto luminoso para se agarrar, mas as estrelas não chegaram essa noite.

Ela então reza baixinho, de olhos para alto, reza para Deus levá-la para casa. Pede com todo o seu coração para que ele conserve lá as arvores, as pombas que voam sem fumaça, para que conserve a terra, o barro e todo o verde .

Uma gota d’água escorre em seu rosto, ela pensa estar chorando – ou então que Deus se comoveu e chora por ela, e amanhã mesmo vai levá-la de volta para casa . Mas ela abre os olhos e vê que não é lagrima o que corre em sua face.

A chuva chegou e agora corre pelo rosto de Tânia. Ela sorri. Sorri porque acredita que Deus a escutou e agora a chuva levará para longe todos os prédios e carros, e trará de volta as árvores e todo o verde. Ela deita no asfalto molhado esperando que amanhã acorde com o rosto sujo de lama.